Contrição:
É a dor de alma pelo desgosto e rejeição dos pecados cometidos.
Deve acompanhá-la o bom propósito; isto é, uma firme vontade de emenda de vida para não voltar a pecar.
Para que a Contrição seja legítima, deve ser interna, ao nível da alma; isto é, não pode ser uma simples expressão feita com os lábios e sem reflexão, pois isto seria apenas mera contrição de boca.
Não é necessário manifestar exteriormente a Contrição interna por meio de suspiros, de lágrimas, etc.; pois tudo isto pode ser sinal de contrição, mas não é, porém, a sua essência.
A essência da contrição está na alma, na sincera vontade de afastar-se deveras do pecado, convertendo-se para Deus.
Além disso, a Contrição deve ser geral.
Isto significa que deve estender-se a todos os pecados cometidos, ou pelo menos, a todos os pecados mortais.
Finalmente, deve ser sobrenatural, e não meramente natural, pois esta nada aproveita.
Segue-se que a Contrição, como todo o bem espiritual, deve proceder de Deus e da Sua Graça; e com a Graça de Deus, desenvolver-se na alma.
Porém, não tenhamos receio; bastando que peçamos a Contrição de boa vontade e que nos arrependamos sincera e espiritualmente, pelo que Deus conceder-nos-á então as graças necessárias.
Se o motivo da Contrição se fundamentar na natureza ou somente na razão (por exemplo, nos danos temporais, na vergonha, na doença, etc.), é muito provável que a dor dos pecados seja simplesmente natural e sem mérito.
Todavia, se o motivo da Contrição é alguma Verdade da Fé (por exemplo: Deus, o Céu, o Purgatório, o Inferno, etc.), então a Contrição será legítima e sobrenatural.
A Contrição legítima e sobrenatural pode ser, por sua vez, de duas classes: perfeita e imperfeita.
E assim, chegámos ao tema principal da...
É Contrição Perfeita quando procede de Amor perfeito a Deus.
E o nosso amor a Deus é perfeito quando O amamos porque Ele é, em Si mesmo, infinitamente Perfeito e Bom (amor de benevolência), e porque Ele nos mostrou o Seu Amor duma maneira tão admirável (amor de agradecimento).
E é um amor imperfeito a Deus o quando O amamos porque esperamos alguma coisa d'Ele (por algum motivo calculista ou interesseiro).
De tal modo que, com o amor imperfeito, pensamos sobretudo nos dons (a receber); e com o amor perfeito, pensamos sobretudo na Bondade do Dador.
Com o amor imperfeito, amamos mais os dons, e com o amor perfeito amamos mais o Dador, e isto não tanto pelos Seus dons, mas principalmente pelo Amor e Bondade que nos Seus dons se manifestam.
Do Amor nasce a Contrição.
Portanto, a Contrição será perfeita se nos arrependermos dos nossos pecados por amor perfeito de Deus, quer este seja de benevolência, quer seja de agradecimento.
Será Contrição imperfeita se nos arrependermos dos pecados apenas ou mormente pelo Temor de Deus, uma vez que pelo pecado perdemos a recompensa de Deus, o Céu, e merecemos o seu castigo, o Inferno ou o Purgatório.
Na Contrição imperfeita, fixamo-nos principalmente em nós e nas desgraças que, segundo a Fé nos ensina, nos acarretou o pecado.
Na Contrição perfeita, fixamo-nos sobretudo em Deus, na Sua Grandeza e Formosura, no Seu Amor e Bondade, vendo quanto o pecado O ofende, e que foi o pecado que Lhe causou tantos sofrimentos e dores para nos redimir.
Na Contrição perfeita, não queremos unicamente o nosso bem, senão também e sobretudo o Bem de Deus.
Com um exemplo envangélico, comprenderemos melhor tal realidade:
Quando São Pedro negou o Divino Salvador, foi para fora e “chorou amargamente” (1 Lc 22, 62).
− Por que é que chora S. Pedro?
É, porventura, por pensar na vergonha que vai sentir diante dos outros Apóstolos?
Se assim fosse, a sua dor teria sido puramente natural e sem mérito.
É por que receia que o Seu Divino Mestre lhe tire, como merece, o cargo de Apóstolo Principal, expulsando-o do Seu Reino?
Essa seria uma boa contrição, embora somente imperfeita.
Mas não; Pedro arrepende-se e chora, antes de tudo, porque ofendeu o Seu amado Mestre, tão Bom, tão Santo, tão Digno de ser amado, e por ter sido tão ingrato ao Seu imenso Amor por ele.
S. Pedro teve, pois, uma verdadeira e perfeita Contrição.
Agora diz-me:
Tens tu também, Cristão da minha alma, algum fundamento, algum motivo, parecido com o de S. Pedro, para te arrependeres dos teus pecados por amor, por amor perfeito e agradecido?
Sim, certamente, pois os benefícios que Deus te tem feito são mais que os cabelos da tua cabeça, e considerando-os, podes dizer, em cada um deles, o que dizia S. João: “Amemos a Deus, já que Ele nos amou primeiro” (1 Jo 4, 19).
E como Deus nos amou?
“Com Amor eterno te amei − disse Ele − e me compadeci de ti e te atraí a Mim” (Jer 31, 3).
Sim, com Amor eterno Ele te amou.
Desde toda a Eternidade, desde quando ainda não havia nem um átomo de ti sobre a Terra, te olhou com aqueles Seus Olhos amorosos e que tudo penetram, e te preparou alma e corpo, Céu e Terra, com o amor com que uma mãe prepara todo o necessário para o filhinho que ainda não nasceu.
Ele deu-te a saúde e a vida, Ele deu-te e dá-te, em cada dia, todos os bens naturais; consideração esta que até aos pagãos pode fazê-los chegar ao conhecimento e Amor perfeito de Deus; quanto mais a ti, Cristão, que conheces outro género muito diferente de amor e de bondade, o Amor e Bondade sobrenaturais de Deus para contigo.
Porque Deus compadeceu-se de ti; e quando, com todo o género humano, estavas condenado pela culpa original, Deus enviou o Seu Unigénito Filho, e Ele se fez teu Salvador e te redimiu com o Seu preciosíssimo Sangue, morrendo na Cruz.
E em ti pensava com entranhável Amor, quando agonizava no Horto das Oliveiras, e quando derramava o Seu Sangue com os açoites e os espinhos, e quando subia, arrastando a pesada Cruz, pelo longo e áspero caminho do Calvário; e quando, cravado nela, Se desfez em Sangue, entre indizíveis tormentos.
Em ti pensava com entranhável Amor, como se tu foras o único homem da Terra.
Que tens a concluir, daqui?
“Amemos a Deus, já que Ele nos amou primeiro” (1 Jo 4, 19).
Quantos há que, só à força de trabalhos e canseiras, conseguem encontrar a verdadeira Fé, e a ti ta ofereceu Deus desde o berço, por puro Amor.
Atraiu-te a Ele e atrai-te sempre pelos Sacramentos e pelas inumeráveis graças interiores e exteriores com que te enche todos os dias, pois, em verdade, estás a nadar, como num imenso mar, na Bondade e Amor de Deus.
E este Amor quer ainda coroar-te, colocando-te consigo no Céu e fazendo-te eternamente feliz.
O que Lhe deves, por tanto Amor?
Não é verdade que deves corresponder-Lhe (em tudo aquilo que estiver ao teu alcance)?
Amemos também a Deus, já que Ele nos amou primeiro.
Pois, vamos a contas, e diz-me:
Como tens pago a Deus, tão Bom e Amoroso, o Seu Amor e Bondade para contigo?
Dir-me-ás, sem dúvida, que com ingratidão e pecados.
E pesa-te essa ingratidão?
Sem dúvida que sim, e queres ressarcir a tua pesada ingratidão, amando quanto possas tão grande e amoroso Benfeitor.
Pois, olha, se assim é, já tens Contrição perfeita, Contrição de amor a Deus.
Para facilitar, chama-se a esta Contrição de amor de Deus, Contrição de Amor, ou de Caridade.
Na mesma Contrição de Caridade, há uma mais elevada, que é quando alguém ama a Deus porque Ele é, em Si mesmo, infinitamente Formoso, Glorioso, Perfeito e Digno de Amor, prescindindo do Seu Amor e Misericórdia para connosco.
Há estrelas − e com esta comparação julgo que entenderás melhor − que, por estarem muito longe de nós, não as podemos distinguir, e contudo, são tão grandes e formosas como o Sol, que tão diligentemente nos dá o calor e a vida.
Pois também, ainda quando o homem não tinha visto nem gozado nunca do Amor de Deus, Eterna Estrela do Céu, ainda quando Deus não tinha criado o Mundo, nem criatura alguma, mesmo assim, Ele era igualmente Grande, Formoso, Glorioso e Digno de todo o Amor, porque Ele é, em Si mesmo e por Si mesmo, o Bem mais Excelente, mais Perfeito e Digno de pleno Amor.
Isso mesmo, e não outra coisa, quer dizer essa expressão que, talvez várias vezes, terás encontrado nos devocionários e nas fórmulas do Acto de Contrição, e que provavelmente ter-te-á parecido um tanto obscura.
Detém-te, pois, agora, e contempla o imenso Amor de Deus.
Contempla-o, sobretudo, nos amargos sofrimentos do Salvador, a cuja luz O compreenderás tão facilmente, quão facilmente Ele te arrebatará o coração.
Autor:
J. Driesch, "Contrição Perfeita - a Chave do Céu!"
Adaptação:
NOVÍSSIMOS DO HOMEM